Sao Tome
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Rússia e a Expansão da OTAN

Optei por este título com o propósito de realçar um detalhe que a imprensa Ocidental omite premeditadamente em relação a esse conflito entre a Rússia e a Ucrânia. Fala-se muito da invasão da Rússia a Ucrânia, mas, entretanto, não se explica as causas reais do conflito.

É necessário fazer-se sempre uma resenha histórica dos conflitosporque muitas vezes fica-se com a perceção de que quem dá o primeiro tiro é o mau da fita.Nem sempre é assim.

Não quero com esta observação apoiar nenhuma das partes beligerantes nem uma solução de guerra para a resolução dos conflitos, tanto neste como em quaisquer outros, porque entendo que em última análise quem sofre são os povos que muitas vezes não têm nada a ver com a situação. Na relação entre Países, a diplomacia é sempre a melhor via para a resolução de conflitos.

Uma das causas do fracasso de uma negociação é o facto de por vezes não se colocara frente das equipas de negociação entidades com formações adequadas em técnicas de negociação,experiência e idoneidade requerida.Negociar exige uma técnica própria, sensibilidade e paciência para ouvir e compreender os problemas do adversário, fazer cedências quando for possível, propor alternativas etc. Mesmo em situação de guerra, deve-se criar um ambiente cordial e amistoso entre os negociadores. Um pequeno detalhe mal avaliado pode deitar abaixo todo um esforço.

Sinceramente não entendo por que razão se inicia um conflito bélico para depois acabar por ser resolvido na mesa das conversações, porque nenhuma guerra perdura para a vida toda. Mas o ser humano é mesmo assim, que fazer?

Dai que as informações devem ser passadas com verdade, sem distorcer a realidade,de modo a que cada um faça o seu perfeito juízo. Lamentavelmente não é isso que tem acontecidoem quase todos os conflitos bélicos e este em particular tem tido uma cobertura sem precedentes.

Neste sentido, vou pautar a minha abordagem de acordo com o meu ponto de vista e as leituras que tenho feito fundamentalmente na imprensa independente, tentando fugir sempre que possível, informações tendenciosas, manipuladas e emocionais, talvez porquequem osdisseminafaz parte do conflito e usa-as como propaganda de guerra. Infelizmente é essa imprensa que consumimos muito aqui em São Tomé e Príncipe.

Esta guerra tem a sua génese nos incumprimentosdos Acordos do Minsk.Por isso é que vou tentar fazer uma breve resenha histórica dos mesmos.

Chama-se Acordos de Minsk por terem sido assinados na capital Bielorrússia,numa primeira fase entre tropas ucranianas e os separatistas pró-russo das regiões de Donetsk e Lugansk. Nestas regiões,morreram mais de 14 mil pessoas, a grande maioria mulheres e crianças, e mais de um milhão ficaram deslocadas. Esse massacre, originou a entrada no conflito de soldados russos para defender essas regiões cujas populações são de origem étnica russa.(Curiosamente a imprensa Ocidental omite estes factos).

Na sequência desses acontecimentos houve numa primeira fase o que se chamou de Acordo Minsk 1, assinado em setembro de 2014. O Acordo estabelecia um cessar-fogo, trocas de prisioneiros, distribuição de ajuda humanitária e retirada de armas pesadas. Por outro lado, referia ainda (proposta da Rússia),que deveria haver diálogo permanente, eleições locais e adoção de uma Leisobre o estatuto especial das duas regiões separatistas que na altura tinham proclamado a independência. (Nenhum Pais reconheceu esse ato na altura, mas a Rússia fê-lo dias antes da invasão).

Entretanto, o Acordo fracassou devido as constantes violações de ambas as partes.

Surge então o Acordo Minsk 2 assinado em 12 de fevereiro de 2015 entre a Rússia, a Ucrânia,a Organização para a Segurança e Cooperação na Europa (OSCE) e líderes separatistas, sob a mediação de França e Alemanha. O Acordo previa 13 pontos, mas tinha como objetivo principal por fim aos combates em Donbass e reintegrar as regiões separatistas apoiadas pela Rússia. Ainda assim, o problema não ficou resolvido e as hostilidades continuaram.

Como disse atrás, o envolvimento da Rússia nesses conflitos das regiões separatistas da Ucrânia deve-se ao facto de Vladimir Putin ter estado a acusar o governo ucraniano de genocídio contra ucranianos de origem étnica russa que vivem nas regiões separatistas deDonetsk e Lugansk. Esta é uma das razões que aRússiajustifica para a invasão da Ucrâniado dia 24 de fevereiro de 2022.

A segunda e a principal razão apontada pela Rússia é a expansão da OTAN pelo Leste Europeu, a eventualidade de adesão da Ucrânia à aliança militarconstituída pela maioria dos países europeus e os Estados Unidos da América.

Há uma verdade incontestável que a Rússia evoca sempre, é o facto da OTAN, que era formada inicialmente por 30 países incluído os EUA o principal financiador desta organização de carris militar, depois da dissolução da URSS, tem vindo a expandir-se para o Leste Europeu, e hoje tem a adesão de mais 14 Países que faziam parte da  ex-URSS.

Com o fim da Guerra Fria e a dissolução do Pacto de Varsóvia era suposto o desaparecimento também da OTAN, já que as razões da existência dessas organizações também desapareceram. O que se tem constatado é que em vez da sua abolição tem vindo a expandir-se em direção as fronteiras da Rússia.

Posto isto, percebe-se facilmente a preocupação legitima da Rússia como podia ter acontecido com qualquer outro Pais que viveu o clima da Guerra Fria, porque se olharmos para o mapa do Leste Europeu, verifica-se que as fronteiras deste Pais estão praticamente cercadas pelos Países da OTAN.

Perante esta situação a Rússiachamou por váriasvezes atençãopara esse facto que pode por em causa a sua segurança e que não toleraria a entrada de Ucrânia na EU e na OTAN, estabelecendo para tanto uma linha vermelha.Por outro lado, a Ucrânia e os países da OTAN veemesta posição da Rússia como um desrespeito a soberania da Ucrânia que devia ter o direito de decidir o seu destino e suas alianças.

Tendo em conta o contexto geopolítico da região, acho que a Ucrânia deveria adotar uma postura mais inteligente, mantendo uma políticade neutralidade,tal como acontece com alguns Países europeus  como, por exemplo, Áustria, Finlândia, Suécia etc.

O assunto agudizou-se mais devido as últimas declarações do Presidente da Ucrânia, Zelensky, que reafirmou a sua intenção de ser membro de pleno direito da EU e OTAN e rearmar-se com dispositivos nucleares. Segundo analistas, esta declaraçãofoi a gotas que transbordou o copo.

Observadores dizem que no fundo esta é mais uma crise entre a Rússia e os Estados Unidos da América com fins hegemónicos e que a Ucrânia foi apenas um ‘’pau mandado’’para testar a Rússia. Alias, diz-se também que a OTAN serve mais os interesses hegemónicos dosEUA e que a Europa é tutelada pelos americanos.

Quem estiver atento a este conflito facilmente compreenderá que tanto a OTAN como a Ucrâniasubestimaram a Rússia. Não se percebe como é que Zelensky não soubesse que o facto de ainda não ser membro da OTAN não tem o direito a auxíliomilitar nem o envolvimento direto dos efetivos dosexércitosdos países membros desta organização? Relativamente as sançõesque têm sido aplicadas a Rússia (assunto que abordarei num próximo artigo),também não consigo entender os seus efeitos desejados sem causar retorno. Por outro lado, nota-se que a Rússia preparou devidamente esta guerrase tivermos em conta o plano de ação da invasão e as alianças que fez nesses últimos tempos.

Para hoje fico por aítendo a consciência de que ficou ainda muito por dizer sobre este conflito. Mas antes, gostaria de referir a questão dosapoios ou não a esta invasão do exército russo a Ucrânia.  Vejo essa votação como um ato simbólico e que não terá, segundo o meu ponto de vista, muito impacto na tomada de decisão da Rússia,já que foram feitas em função de interesses políticos, geoestratégicos e económicos de cada Pais.

Um pais como São Tomé e Príncipe que recebe muitos apoios da Europa e dos Países Ocidentais seria muito imprudente não votar contra a invasão, até porque já não temos a cooperação muito intensa com a Rússia. Costuma-se dizer que, ‘’os Países não têm amigos, têm interesses´´. Para dizer que independentemente da opinião de cada cidadão, o Estado são-tomense se posicionou bem neste conflito.

Até breve!

São Tomé, 17 de março de 2022

Fernando Simão